CENSURA CONTRA A REVISTA FORUM DEMOCRATICO: DEBATE NA COMUNIDADE ITALIANA
por andrea em sábado, 30 de outubro de 2010 às 18:37
A carta de Luis de Paula.
Eu penso ao contrário: esta discussão deveria, sim, ser prolongada. Mais que isto, deveria ser mais exposta, sair desta tradicional limitação em que tudo que se relaciona com a Italia é discutido apenas em circuitos fechados.
Trata-se de um fato grave, uma denúncia, relacionada com um caso de censura a um veículo da Imprensa, onde a liberdade de expressão deve ser mantida a qualquer custo. É um caso que precisa ser verificado e, se confirmado, ampla e veementemente condenado por todos que sabem o valor que a Liberdade, em todas as suas formas, significa para uma pessoa, uma sociedade e uma nação.
Como eu já manifestei anteriormente, também entendo que o atual governo italiano envergonha qualquer cidadão – e nem precisa ser italiano, não! – que tem capacidade para perceber que a sua notável tendência ditatorial está levando inúmeros valores democráticos conquistados ao longo da História ao retrocesso.
A sensação que tenho atualmente é a de que a Italia não está se dando conta de nada. E o maior exemplo que temos é o que tem feito com as centenas de milhares de pessoas que continuam nas filas consulares, um claro desrespeito a leis que o seu Parlamento promulgou e que, portanto, deveriam ser seguidas à risca pelas instituições que representam o Estado italiano.
É inconcebível que a Italia mantenha cerca de meio milhão de ítalo-brasileiros em filas que duram anos a fio. Mais inconcebível, ainda, quando observamos que estas filas são exatamente para torná-los efetivos cidadãos do país. País que, aliás, já deu as costas a seus filhos em épocas não tão distantes no tempo histórico, o que parece não ter servido de lição, apesar da experiência tão invulgar.
Diante do atual cenário mundial, torna-se mais fortemente inconcebível que um país demore tantos anos – os prazos de espera chegam a mais de 10 anos em algumas regiões! – para registrar cidadãos que desejam exercer a sua cidadania de modo pleno.
E até ininteligível que, diante de constantes crises internacionais, a Italia não se dê conta do valor que tais recursos humanos significam para o seu próprio futuro, ainda mais considerando-se que ela própria apresenta um perfil que revela forte envelhecimento da sua população e taxas de natalidade insistentemente baixas.
Por que não transformar esta situação, que aparentemente é tratada como mais um “incômodo político” ao atual governo, em uma fonte de recursos para o seu desenvolvimento? Por que não tornar desta situação, única no mundo, em um fator de desenvolvimento para ambos os países, Italia e Brasil, que têm tantas coisas em comum, inclusive interesses econômicos? Por que não tirar proveito deste cenário e transformá-lo em “ganho político” para ambos?
Mas não vemos nenhum movimento aparente nestas direções. O que se vê é todo o esforço que foi feito nos últimos dois anos para atenuar o problema sendo jogado fora. Sem que fossem dadas as mínimas justificativas àquelas mais de 500 mil pessoas “enfileiradas”. Nem um só palavra, um só comunicado público. Nada.
A impressão que tenho é que a Italia não gosta de conversa. Como também não gosta de críticas, feitas através da imprensa, de cartas, em-mails ou qualquer outro meio. Fecham-se em processos burocratizados, decidem e ponto final. Não sabem dialogar e nem tratar amorosamente aqueles que têm amor por ela, mesmo quando fazem uso da palavra com a intenção de ajudar. Preferem o silêncio em lugar das vozes, exceto quando elas adulam.
Estou cansado de esperar pela Italia, de sonhar com uma Italia melhor do que esta que, infelizmente, passei a conhecer fora dos meus antigos sonhos. Toda a imagem que construí ao longo dos meus sessenta anos esvai-se a cada acontecimento como estes que tenho conhecido ou verificado.
Nasci ouvindo apenas coisas boas a respeito da Italia. Aprendi a tê-la como minha segunda pátria, embora nunca tenha imaginado que um dia quisesse tornar-me um cidadão italiano de verdade. Se hoje eu estou na fila, não é porque preciso de um passaporte europeu nem porque tenha a pretensão de buscar trabalho por lá. Tudo o que me moveu neste sentido foi a vontade de resgatar um pedaço da minha história, da história da minha família, o que já consegui a contento. Mas pretendo, sim, deixar as portas abertas por lá para o meu filho – que hoje está estudando no Canadá, mas poderia estar na Italia, não fosse esta vergonhosa fila que temos no Rio de Janeiro! – e para os meus sobrinhos. Quero dar a eles as condições de ampla liberdade que, infelizmente, meus avôs e pais não se preocuparam em facultar a mim e meus irmãos. É o que me basta.
No mais, não vou mais me estender. Posso apenas lamentar que a Italia ainda não tenha percebido que todas estas coisas feias, ruins, injustas e incompreensíveis só servem para afastá-la mais e mais dos ítalo-descendentes. Se as filas consulares diminuírem ocasionalmente, certamente será porque muitos estarão “desistindo” dela. A magia que faz tanta gente sentir um amor especial pela Italia está sendo destruído aos poucos. Como na vida, quando um amor se desfaz por total desilusão, não há jantar à luz de velas que dê jeito. abraço, Luis de Paula. Non importa il Paese dove viviamo ma il Paese che vive in noi. (G. Garibaldi)